quarta-feira, 9 de abril de 2025

Sobre a trilogia do "Antes", de Richard Linklater

Créditos: Max Finkel


Recentemente assisti, em três dias, aos três filmes da trilogia do "Antes", do diretor e roteirista Richard Linklater: "Antes do Amanhecer" (1995), "Antes do Pôr-do-Sol" (2004) e "Antes da Meia-Noite" (2013). Cada um desses filmes (com um intervalo de 9 anos entre eles) apresenta a trajetória do casal Jesse e Céline de forma particular e interessante, tendo chamado bastante a minha atenção e me cativado logo de cara. Nunca havia assistido aos filmes antes, mas sempre via as pessoas falando sobre eles. Assisti e entendi o porquê. Então, por essas razões, decidi escrever um post aqui no blog para falar sobre os longas e minha visão acerca deles ❤


O primeiro filme é sobre o que poderia ter sido, o segundo sobre o que deveria ter sido. "Antes da Meia-Noite" é sobre o que é. - Ethan Hawke, em entrevista ao The Guardian

 

ANTES DO AMANHECER (1995)



O primeiro filme, "Antes do Amanhecer", nos apresenta Jesse (Ethan Hawke, que também trabalhou com Linklater no ótimo Boyhood) e Céline (Julie Delpy) desde o momento em que eles se conheceram, em um trem que partia para Viena. Lá, Jesse passaria um dia até, na manhã seguinte, retornar para seu país natal, os Estados Unidos. Já Céline não faria parada em Viena, seguindo até Paris. Entretanto, ao pararem em Viena,  Jesse propõe à moça que passe aquele dia com ele. Ela aceita e, a partir disso, o filme se desenrola em longas caminhadas por Viena, momentos recheados com diálogos afiados, reflexivos e sinceros. 


É muito bonito ver o interesse entre ambos desabrochar ali mesmo naquele trem e ir crescendo à medida que compartilham experiências e conversas. Além disso, o longa é recheado de detalhes que fazem com que tudo soe muito genuíno: os gestos, os olhares, as palavras, a respiração das personagens, os sorrisos... Tudo contribui para construir a atmosfera etérea que permeia o filme, sentimento compartilhado pelos próprios protagonistas, que dizem que tudo parece "um sonho". Tudo carrega consigo o desejo profundo de conexão, o anseio e a curiosidade pelo outro, a urgência causada pela noção de que em um dia eles tomarão rumos opostos... e há muita poesia envolvida nessas quase duas horas do filme.


Se existe algum tipo de magia nesse mundo... deve estar na tentativa de entender alguém, compartilhar algo...


É uma experiência muito bonita assistir a esse filme, e você (pelo menos eu) nem sente o tempo passar, de tão imerso que fica nos diálogos dos dois e nesse afeto que brota quase como se fosse um conto de fadas moderno - mas, que, ainda assim, soa real. 


Créditos: @umfilmemedisse, via Instagram


Ao final do longa, Jesse e Céline prometem um para outro se reencontrarem naquela mesma estação de trem em Viena depois de 6 meses, e, assim, o filme termina. Deixa, então, a pergunta no ar: eles realmente se reencontram após esse período?


ANTES DO PÔR-DO-SOL (2004)



No segundo longa da trilogia, lançado e passado 9 anos após os eventos do último filme, temos a resposta que pairou durante todo esse tempo no ar: não, eles não se reencontraram. A avó de Céline faleceu bem no dia marcado, e ela não pôde comparecer ao encontro, embora Jesse tenha ido. 
Ele, aliás, tornou-se um escritor e lançou seu primeiro livro, inspirado nos acontecimentos do longa antecessor e, consequentemente, em sua breve história com Céline. Ao viajar pela Europa em decorrência dos eventos de lançamento da obra, Jesse passará seu último dia no Velho Continente em Paris, cidade da moça. Então, sabendo do evento, Céline vai até a livraria em que Jesse está divulgando seu livro e eles podem se reencontrar, finalmente.

Assim, eles conversam sobre como a vida se sucedeu durante todos esses anos. Jesse está casado e tem um filho, além de ter se tornado escritor, Céline possui um namorado fotógrafo que está sempre viajando e trabalha em uma ONG. Ambos amadureceram e podemos perceber essa mudança em relação ao filme anterior: antes eram jovens extremamente sonhadores e tudo era muito novo, tudo tinha muito frescor. Agora, a vida passou e tiveram mais experiências, mais alegrias, frustações e arrependimentos.  A vida continuou a acontecer. E aí, quando menos esperavam, essa mesma vida ofereceu uma segunda chance para os dois. 

Eu quero pintar mais, quero tocar meu violão todos os dias, quero aprender chinês, quero compor mais canções... Tem tanta coisa que quero fazer, que acabo não fazendo muito.


Aqui, eles continuam a refletir sobre si mesmos, sua relação um com um outro e como se recordam dos eventos passados. Refletem sobre os erros que cometeram, - como a decisão de não trocarem números de telefone nem endereço em Viena - sobre as transformações que passaram... sobre, enfim, a vida.

Não se pode substituir ninguém, porque todo mundo é uma soma de pequenos e belos detalhes. 

Créditos: Cinéfilo Em Série, no Pinterest


Dessa forma, Jesse e Céline se reconectam e é bonito poder presenciar isso. Como eles não esqueceram um do outro - Jesse até escreveu um livro e Céline, uma canção (que ela toca para ele ao final do filme, em uma cena muito singela e adorável). O filme é bem curtinho, afinal, o tempo que Jesse e Céline têm é ainda menor do que no antecessor: no mesmo dia, Jesse precisa pegar o avião para retornar aos Estados Unidos. Porém, apesar de curto, é igualmente bonito e reflexivo. Honesto. Poético. E mais maduro, como suas personagens. 



ANTES DA MEIA-NOITE (2013)



Após Jesse perder o avião no longa anterior e ter escolhido ficar com Céline, podemos finalmente acompanhar os dois se relacionando de fato, como casal - uma coisa mais concreta. Mas não é no princípio do relacionamento. Na realidade, passaram-se nove anos desde o último longa, e aqui ambos possuem filhas gêmeas e estão terminando de passar as férias na Grécia. 

O filme se inicia na despedida de Jesse e o filho mais velho, que teve com sua ex-esposa, uma vez que o menino precisou voltar para os Estados Unidos. Esse é um ponto importante, pois a distância entre o filho e Jesse, além do relacionamento ruim entre a mãe dele e os protagonistas, é um aspecto que gera muitas discussões entre Céline e Jesse. Jesse quer se mudar para os Estados Unidos, Céline prefere que o menino more com ambos em Paris. No entanto, a guarda é da mãe dele e ela nunca aceitaria isso.  Para completar, Céline recebeu uma excelente proposta de emprego, e mudar-se para outro país é um fator complicado. Essas questões iniciam as discussões de ambos, que revelam, aos poucos, outros aspectos difíceis de um relacionamento já desgastado: mágoas, expectativas diferentes e expectativas frustradas, o desejo de permanecerem unidos pela consideração que possuem um pelo outro, mas não sabendo mais se é possível... o desgaste do amor.

Créditos: @umfilmemedisse, no Instagram

Em relação aos dois filmes anteriores, "Antes da Meia-Noite" é o mais "pé no chão" e também acho que é o mais triste, ao mesmo tempo que é o que soa mais real. Jesse e Céline já estão na meia-idade e precisam lidar com questões que antes não precisavam, e todas elas são apresentadas sob uma perspectiva realista e sincera, tipicamente humanas. Mais uma vez, os diálogos continuam afiados e bastante honestos, explorando outras faces do relacionamento de ambos e das dificuldades enfrentadas pelo casal. Admito que chorei ao terminar ao filme - não logo depois de ter concluído, mas ao refletir sobre ele pouco tempo depois. Creio que seria muito cômodo seguir a premissa de um relacionamento sempre perfeito, com ares de comercial de margarina, mas o destino de Jesse e Céline é mais crível, mais sincero. Conflitos todos têm, é claro, mas o fato de aqui eles estão em pleno declínio torna tudo mais triste. Poderia facilmente ser a história de um casal conhecido. Não significa que o amor não existiu - é claro que existiu, nós presenciamos tudo! - mas será que ele perdura, suporta a tudo? Assistir à tentativa de ambos de permanecerem juntos, de continuarem lutando um pelo outro, mesmo proferindo palavras duras em seus diálogos, é realmente franco e triste. 

É um filme que, assim como os outros, é muito bonito. Diferentemente dos outros dois, que deixam um gosto agradável de inúmeras possibilidades, quase como uma coisa mágica, esse deixa um sabor amargo no peito. E deixa em dúvida o destino dos dois: eles vão se recuperar, vão se divorciar? Bom, não sei. Só me resta torcer para que, nesse espaço aberto que ficou, tudo tenha dado certo apesar dos pesares. É no que eu prefiro acreditar. 

FIM! 

É isso, pessoal! Uma trilogia muito bonita que vale a pena conferir. Acompanhar Jesse e Céline foi uma bela jornada, e agora guardo eles aqui dentro, comigo ❤


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